Primavera com neve

Quero recuperar as Canções de embalar
que pertenceram à tua infância.
Viajar no tempo e descobrir qual foi
o primeiro crepúsculo que te emocionaou.
Quero tocar piano na tua pele
como se sentir fosse um lugar remoto,
chorar nos teus lábios porque beijar foi
sempre imitar as lágrimas, perdidamente.
Quero tactear a chuva nos teus cabelos
e murmurar baixinho o perfume das papoilas,
apagar o clarão intenso das tuas pálpebras
como se viver fosse dançar entre feiticeiros.
Quero a lenta e sinuosa saliva da tua língua,
assim são as aves de areia fugindo da sede.
Foi na tua alma que aprendi a escrever
e no teu corpo, os deuses salvaram-me da loucura
de nunca mais poder esquecer quem sou.

 

António José Rodrigues (Figueira da Foz)